OS PESOS-PESADOS, DE JOHN L. SULIVAN A MUHAMMAD ALI

09/03/2012

Por Paulo Roberto Godinho

Falar-se da história desta emocionante categoria de pêso do Boxe moderno, pouca teria que se dizer, depois da era Muhammad Ali. Tyson? Hollyfield? O primeiro foi a maior de todas as máquinas demolidoras que os ringues já viram nesses mais de trezentos anos de histórias, em todas as categorias de pêso, mas nada além de um boxeador violento que viveu uma época em que a safra de pesos-pesados começa-va a rarear de valores reais. O que ficou de Tyson foram os fulminantes KOs em pugilistas que nada ou quase nada representavam para a categoria maior do Boxe.

Evander Hollyfield teria sido o melhor e mais técnico de todos os boxeadores nos meio-pesados e cruzadores, se tivesse ficado nessas categorias. A chance de receber grandes somas o fez buscar processos

e tratamentos nada convencionais até tornar-se um "pêso-pesado", mas, apesar de sua fina técnica não chegou a emocionar, nem nunca chegou a ser visto como um pesado de verdade. Os que o sucederam, até osd dias presentes, não merecem comentários, fazendo-nos crer que recordar os grandes de ontem, pode ser o consôlo que temos para sentir que ainda possam existir ótimos pesos-pesados no mundo.

JOHN L. SULIVAN, MARCO ZERO DA ERA MODERNA

O primeirocampeão peso-pesado da Era Moderna foi John Laurence Sulivan, ou "John L" que, coincidentemente, foi o último do período antigo. A diferença entre essas duas eras, foram as regras de combate,

estabelecidas em 1885 pelo Marquês de Queensberry, na Inglaterra, onde o Boxe começou. Sulivan ganhara o título mundial dos pesados no tempo dos punhos nús, onde, entre outras diferenças, não se usavam luvas, anteriores às regras do Marquês, ganhando também o título desta categoria pelas Regras Queensberry, em 1885, mantendo-o até 1892, quando foi derrotado pelo também americano James J. Corbett, por KO no 21º round. Corbett perderia o título para o inglês Bob Ftzsimmins, em 1897, por KO no 14º. Fitzsimmons, um ferreiro inglês foi o primeiro estrangeiro (não americano) a sagrar-se campeão mundial de pesados na era moderna. Dois anos depois, Bob Fitzsimmons seria derrotado por James J. Jefries por KO no 11º. Jefries foi um notável campeão, mantendo seu título até 1904, quando rico e coberto de glórias, retirou-se invicto como campeão. Em 1905, lutaram pelo título vago Jack Root e Marvin Hart, cabendo a vitória a este último, por KO no 12 º.

Logo a sua primeira defesa de título, Marvin Hart foi derrotado pelo australiano Tommy Burns, por pontos em 20 rounds, em 23 de Fevereiro de 1906. Burns foi um notável ganhador, mas seu reinado seria interrompido em 26 de Dezembro de 1908, ao ser derrotado pelo negro Jack Johnson, por KO no 14º.

John Arthur Johnson, ou Jack Johnson, apelidado de "Gigante de Galvestone", "Maravilha Negra", e outros elogios. Ele foi o desespêro da sociedade racista americana, que não admitiu ver um negro campeão mundial de pesos-pesados. Johnson tinha hábitos da nobreza da época, como a paixão pelas corridas de cavalos, viagens pelo mundo, roupas elegantíssimas e... esposas brancas. Um personagem que começou a mudar a história do Boxe em todos os sentidos. O ódio dos racistas americanos fê-lo deixar os Estados Unidos e ir morar na Europa, onde permaneceu por alguns anos. Já em idade de parar de lutar, tudo indica que Johnson "negociou" sua volta aos estados Unidos, "entregando" no ringue seu título ao branco Jesse Willard, em Havanma, Cuba, no dia 5 de Abril de 1915, uma contestada derrota por KO no 26º tempo.

Willard foi um campeão inexpressivo, tendo perdidoa corôa para o lendário Jack Dempsey, em 4 de Julho de 1918.

JACK DEMPSEY, OS GRANDES PÚBLICOS E AS GRANDES ARRECADAÇÕES

Jack Dempsey foi o início da era dos públicos e das rendas de bilheteria extraordinárias: por mais de tres oportunidades suas lutas arrecadaram mais de US $ 1,000,000.00, e públicos superiores a 80.000 pessoas. Foi o primeiro boxeador a empolgar o mundo com suas apresentações fantásticas e a se tornar conhecido e admirado dentro e fora dos Estados Unidos. O primeiro dos maiores, e, se hoje tivéssemos que escolher os melhores pesados de todos os tempos, Jack Dempsey não deixaria de estar entre os tres primeiros.

Gene Tunney ganhou o título de Dempsey em 1926, e abandonou o Boxe em 1928, sem perder o título no ringue. Numa luta válida pelo título vago, o alemão Max Schmmeling ganhou do americano Jack Sharkey atrvés de um contestado "foul" no 4º round, em 12 de Junho de 1930. Em 1932 haveria a revanche e Sharkey derrotaria Schmmeling por pontos em 15 rounds. Em 1933 Jack Sharkey era derrotado pelo gigante italiano Primo Carnera, que também não demorou muito com o título, perdendo-o para Max Baer em 1934. Em 1935, Max Baer perdia o título para James Braddock, por pontos em 15 rounds.

Em 1937, James Braddock sucumbiu em oito rounds para o novato Joe Louis.

A ÉPOCA DE OURO DE JOE LOUIS

Joseph Luis Barrow, um negro de Detroit, reinou na categoria pesados por quase uma dúzia de anos; foi de fato o melhor peso-pesado que o mundo conheceu até o seu aparecimento, e ainda hoje, muita gente, e eu próprio, o consideramos, o melhor de todos os tempos. Joe Louis se fez querido até da sociedade racista americana, que o aceitou naturalmente, por suas inacreditável humildade, por suas lições de patriotismo, e enorme colaboração ao Governo americano, servindo como sargento ao Exército do seu país, e, em certa ocasião, doando por duas vezes as rendas de duas das suas défesas de título, a Fundos Beneficentes do Exército e da Marinha americana, mas, no final de sua carreira, o Imposto de Renda não o poupou de suas tributações, que só lhe foram perdoadas no Governo Kenedy.

Louis tem uma estátua na entrada do Caesar Palace, em Las Vegas, onde, já no final de sua vida, trabalhou como uma espécie de porteiro, até que um derrame o lançou numa cadeira de rodas, e ele morreu pobre, em 12 de Abril de 1981, aos 67 anos de idade. Joe Louis defendeu seu título de pesados 25 vezes, de 1937 até 1948, quando se retirou invicto como campeão. Um feito ainda não igualado por nenhum outro boxeador em nenhuma categoria de peso, no mesmo peso.

O título vago de Louis seria disputado em 1949 entre Ezzard Charles e Jersey Joe Walcott, com vitória de Walcott aos pontos no final de 15 rounds, sagrando-se campeão. Em 1951, Walcott defenderia seu título contra o mesmo Ezzard Charles, desta vez, vencendo-o por KO no 7º.

Em 23 de Setembro de 1952, o desafiante Rocky Marciano ganha o título de Walcott, nocauteando-o no 13º round. Rocky Marciano foi o único lutador de peso-pesado a entrar e a sair do Boxe invicto, antes e depois de se tornar campeão. Marciano abandonaria o Boxe em 27 de Abril de 1956, com o notável cartel de 49 lutas, 49 vitórias, 43 por KO !

Com a saída de Rocky Marciano, o título foi disputado entre Archie Moore e Floyd Patterson, com a vitória deste último por KO no 5º round. Em 26 de Junho de 1959, Floyd Patterson perde o título para o sueco

Ingemar Johansson, e conseguiu recuperar seu título contra este mesmo Ingemar, em 20 de Junho de 1960. Era a primeira vez na história moderna dos pesos-pesados, que um campeão conseguia ganhar de volta a sua coroa. Floyd Patterson era um ex-campeão olímpico dos pesos médios, que subira de categoria e começava a ganhar as simpatias do público americano. Ele fora recolhido das ruas de New York pelo treinador Cus Damato, o mesmo que mais tarde recolheria Mike Tyson, que preparou Patterson como um modêlo de virtudes; um outro negro que os racistas americanos aceitaram bem.

Egresso de uma penitenciária americana apareceu um peso-pesado de nome Charles "Sonny" Liston, que implodiu Patterson duas vezes em apenas um round, e a América desesperou ao ver o título dos pesados

nas mãos de um antigo presidiário, muitas vezes acusado de estar ligado à Máfia do Boxe da época. Liston simplesmente ganhou o título num KO de 1º round, e na revanche, fê-lo mais rápido ainda, outro KO no

1º tempo. Quem poderia para aquela máquina destruidora?

CASSIUS CLAY, O TAGARELA DE LOUISVILLE

Em Louisville, Kentucky, surgira um peso-pesado de nome Cassius Marcelus Clay Jr. que fora campeão olímpico em 1960 (Roma), estava invicto como profissional em quase 20 lutas, falava muito e costumava anunciar antes das lutas, em que round iria acabar com seus adversários. Este Cassius Clay chocou o mundo, quando em 25 de Fevereiro de 1964 arrebatou o título de Liston, por KOT no 7º round. No dia seguinte ao da luta, Cassius Clay reuniu a Imprensa e anunciou que renunciava ao seu nome escravo, passando-se a chamar Muhammad Ali, "Aquele Que é Digno de Louvor", e aí começou uma nova era; muito mais agitada, muito mais vibrante, absolutamente ideológica, que necessitaríamos de um livro inteiro para falar da saga deste extraordinário figurante da história americana; um paladino do preconceito racial que mostrou no ringue, a maneira de um boxeador de pouco "punch" brilhar na movimentação de pernas e colocação de golpes mais inteligentes do que fortes. Muhammad Ali, um nome que o mais exigente dos especialistas em Boxe, dificilmente esquecerá em sua lista de melhores. Ganhou e perdeu o título tres vezes, e se aposentou em 11 de Dezembro de 1981. Ali ganhou o título de Liston em 1964; teve esse título cassado pelo Governo americano em 1968, mantendo-se inativo até Outubro de 1969, quando retornou ao Boxe e só em 30 de Outubro de 1974, conseguiu recuperar seu título, ganhando de George Foreman. Em 15 de Fevereiro de 1978 perdeu o título para Leon Spinks, recuperando-o logo a seguir contra o mesmo Spinks, aos pontos, em 15 rounds, no dia 15 de Setembro de1978. Em 1979 anunciou sua retirada do Boxe mas em 1980 desafiava o então campeão Larry Holmes, de quem perdeu por KOT no 11º. Em 11 de Dezembro de 1979, Ali, melancolicamente era batido aos pontos em 10 rounds pelo novato Trevor Berbick, encerrando a carreira.

Com a cassação do título de Muhammad Ali, o título foi disputado num torneio de pretendentes vencido por Joe Frasier em 16 de Fevereiro de 1970; Frasier perdeu o título para George Foreman em 22 de Janeiro de 1973; e George Foreman perdeu o título para Muhammad Ali no dia 30 de Outubro de 1974, mas viria a perdê-lo para Leon Spinks em 15 de Fevereiro de 1978; Leon Spinks perderia o título para Muhammad Ali em Setembro de 1978. Ainda em 1978, a World Boxing Council proclamou Ken Norton campeão mundial dos pesados, mas Norton o perderia logo à sua primeira defesa contra Larry Holmes, que o manteve até se retirar sem derrota, em Novembro de 1983, com um notável cartel de 45 lutas, 45 vitórias. Holmes fora antigo "sparring" de Muhammad Ali, e acredito, que depois dele a categoria pesados mostrou o demolidor Mike Tyson, que andou muito longe de ser um boxeador, apenas um bombardeador, o maior e mais destruidor de quantos existiram De John L. Sulivan para cá.